Publicado em: 12 de setembro de 2018
Sergio Caldieri*
O povo Palestino e os oprimidos do Terceiro Mundo perderam o seu maior defensor em dia 5 de setembro de 2008, no Rio de Janeiro. O jornalista e escritor Fausto Wolff morreu aos 68 anos por disfunção múltipla dos órgãos. Ele nasceu em Santo Ângelo (RS), em 17 de outubro de 1940, com o nome de Faustin von Wolffenbüttel, e aos 14 anos começou a trabalhar como repórter de polícia no Diário de Porto Alegre. Aos 18 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde trabalhou nas revistas O Cruzeiro e Manchete e nos jornais O Globo, JB e Tribuna da Imprensa.
Durante 52 anos de carreira jornalística incomodou muita gente com suas matérias criticando todos os eternos poderosos que massacravam e sugavam a população mais pobre e injustiçada. Fausto sempre foi o porta-voz dos oprimidos e pagou um preço muito caro por defender a causa palestina nos últimos 30 anos. Bastava ser considerado comunista para viver como um marginalizado na imprensa e ter que sobreviver na imprensa alternativa.
Durante o regime militar teve que se exilar na Dinamarca e Itália, onde deu aulas de literatura em duas universidades, em Copenhague e Nápoles.Trabalhou nos mais importantes jornais e revistas brasileiras. Em 1969, fez parte da equipe do mais combativo jornal O Pasquim que durante a ditadura militar (1964-1985), incomodou os ditadores militares de plantão. Com um grupo de jornalistas fundou o jornal Tribuna Socialista, considerado o primeiro jornal de esquerda depois da ditadura. Trabalhou em programas de televisão onde falava dos problemas políticos, culturais e internacionais.
Fausto Wolff escreveu mais de 20 livros de vários temas: políticos e romances, e era considerado um dos maiores romancistas brasileiros quando foi consagrado com o Prêmio Jabuti pela sua obra ‘À mão esquerda’. Nos últimos anos fazia traduções de livros, pois dominava muito bem o alemão, inglês, francês, espanhol e italiano.
Fausto dizia que a esquerda no Brasil parece um bando de rebeldes sem caráter e sem vergonha. A nossa cultura foi roubada, o jornalismo foi roubado e a música foi roubada. Só vejo um bando de acadêmicos idiotas dizendo besteiras que aparecem na televisão dizendo coisas que o povo não entende.
Sempre foi um jornalista combativo e crítico em todas áreas, como também foi diretor e crítico de teatro. Ele dizia que para escrever entre o bancário e o banqueiro, sempre defenderei o bancário; entre o lavrador e o latifundiário, escreverei sobre o camponês e o MST-Movimento dos Sem Terras; e entre os judeus e palestinos, estarei escrevendo e defendendo os palestinos.
Em 1978, Fausto Wolff esteve no Líbano e entrevistou o líder Yasser Arafat, da Organização da Libertação da Palestina. Co Fernando Morais visitaram os campos de refugiados. Quando voltou publicou o livro ‘Os Palestinos: Judeus da 3ª. Guerra Mundial’, começou a perseguição dos sionistas contra Fausto Wolff. Não conseguia emprego nos grandes jornais. Ele dizia que estes dirigentes israelense querem um holocausto glorioso contra os palestinos. É uma vergonha por parte do militarismo judeu, por parte daquilo que aconteceu durante a Segunda Guerra Mundial, ou seja, deles deixarem se matar daquela maneira. Acho que eles reagem contra o inimigo errado. Os judeus em vez de continuarem com ódio dos alemães, sempre transferiram o ódio deles contra os árabes, principalmente com a comunidade palestina.
Fausto Wolff sempre escreveu seus artigos criticando as atitudes belicitas israelenses, apoiadas pelos Estados Unidos. Foi o eterno defensor os direitos dos palestinos viverem nas suas terras e não como refugiados sofrendo constantes ataques israelenses. A esquerda israelense e os judeus que vivem fora de Israel é que não querem. Tratam o conflito como se fosse um jogo de futebol, no qual torcem para o seu time. Em guerra se torce por quem tem razão e a razão está ao lado dos palestinos, dizia Fausto Wolff.
O jornalista ficava irritado quando os inimigos diziam que era antissemita, e ele respondia: nunca aceitei o insulto de antissemita, pois não sou contra etnia alguma. Alguns do meus melhores amigos são judeus e antissionistas. O Alberto Dines chegou a escrever um pósfácio em um livro meu. Sempre questionei perguntando como grande ídolos como Jesus Cristo, Karl Marx, Freud e Einstein, todos judeus, diriam de uma figura como Ariel Sharon? E a direita brasileira chamava Fausto Wolff de relações públicas de Yasser Arafaf.
No livro ‘A imprensa livre de Fausto Wolff’ ele citou uma parte do livro O apartheid de Israel, do judeu brasileiro Nathaniel Braia, onde dizia: “A posse de Sharon, apesar dos crimes contra os palestinos, tem permitido desnudar para os judeus e para o mundo inteiro a dimensão e a gravidade da doença embutida na ideologia que serviu de base para a usurpação da Palestina. Através de Sharon podemos ver como a lógica promovida por essa ideologia está levando à deformação e à desumanização das instituições de Israel – principalmente o seu Exército – cada vez mais profundas e perigosas”.
Outro livro que destemido jornalista Fausto Wolff recomendava ao seus leitores era o livro de Norman Finkelstein, ‘A indústria do holocausto’, onde diz que os líderes sionistas têm por base “a falsificação e a exploração do genocídio nazista” para “desviar as críticas a Israel e sua política indefensável”. Outro grande escritor que Fausto citava no seus artigos era as opiniões contundentes de Noam Chomsky que escreveu 1O papel de Israel na política externa norte-americana’.
Fausto Wolff nunca se conformava por que Israel não se transformava numa democracia com direitos e deveres iguais para todos onde habita uma maioria de cidadãos que pratica a religião judaica, como no Brasil, onde a maioria é católica, ou como na Inglaterra, onde a maioria é anglicana? Fausto achava que é a questão, na superfície, é tratada como uma questão religiosa quando, na verdade, envolve poder colonial, econômico, político e o confisco de reservas de água e de petróleo assim que – como a crônica de morte anunciada – os Estados Unidos começaram a bombardear o Iraque.
O jornalista com quase dois metros de altura e pesava uns 120 quilos, sempre foi uma fortaleza, pois na ditadura militar, os agentes da repressão tentaram prendê-lo, mas não conseguiram porque era muito grande, e precisava de vários homens para segurá-lo. Fausto nunca se curvou como disse no velório o presidente do Partido Comunista Brasileiro Ivan Pinheiro, e o jornalista Mário Augusto Jakobskind que relembrou dos encontros do amigo em Cuba, onde ele cantava A Internacional, a sua música preferida dos revolucionários.
Nos último três anos, Fausto Wolff manteve a coluna diária mais lida no Jornal do Brasil. Em outubro de 2005, Fausto escreveu dois artigos que incomodou a comunidade judaica, e reclamou com a direção do jornal, alegando que Fausto Wolff tinha jogado mais lenha na fogueira, chamando os governantes de Israel de nazistas, assassinos cruéis, e difamando de forma grosseira Ariel Sharon. Num artigo, Fausto dizia: “Tem-se a impressão de que os protagonistas desses crimes, desses assassinatos, desses estupros – vítimas e algozes – vivem num outro mundo e quando se aproxima de nós podem ser facilmente identificáveis como cidadãos de segunda categoria, tal qual os judeus eram para os nazistas e os palestinos são, hoje em dia, para os judeus”.
Outro comentário de Fausto nas suas coluna foi: “Ora, esses patifes todos, essas aves de rapina, se dizem católicos, protestantes, judeus. Se isso fosse verdade, bastaria que seguissem os ensinamentos de Moisés e de Cristo e não haveria um só faminto no mundo. Os verdadeiros revolucionários, como Jesus, Buda, Giordano Bruno, Galileu, Einstein, Schweitzer e Russell, entre tantos outros, só são louvados hoje em dia porque estão mortos e os mortos não perturbam o poder”.
Durante o velório de Fausto Wolff, falei em nome do Comitê da Palestina Viva Intifada, agradecendo diretamente ao meu lado o proprietário do Jornal do Brasil Nelson Tanure por ter resistido as pressões da comunidade judaica e não ter demitido o jornalista da sua redação, pois Fausto foi a única voz na imprensa brasileira que sempre defendeu a causa palestina. Foi um jornalista que honrou a classe de jornalistas brasileiros, que sempre esteve ao lado dos ofendidos e humilhados, denunciando as injustiças e contrariando os poderosos.
UM EXEMPLO A SEGUIR
Valter Xéu
Editor de Pátria Latina
Conheci Fausto no inicio dos anos 80 sendo que antes o acompanhava na edição semana do Pasquim on de ele escrevia uma coluna.
Era ele um dos colaboradores do Noticias da Bahia, jornal que eu editava em Feira de Santana e depois passou a integrar a equipe do Pátria Latina
Desde a fundação do Pátria em fevereiro de 2002 ate a data da sua morte.
Sempre batíamos longos papos por telefone ou nas minhas idas ou passagens pelo Rio de Janeiro e compartilhava daquele sentimento de que jornalismo é a defesa dos fracos e oprimidos e o resto é perfumaria.
Pátria Latina com quase 17 anos de vida. Tem na sua equipe vários Fausto Wolff e com todos eles, continuaremos firme e forte seguindo fielmente o estilo de jornalismo do grande Fausto Wolff.
*Sergio Caldieri – Jornalista, escritor e vice-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro-SJPERJ