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Análise jurídico social sobre a tragédia de Brumadinho/MG.


Publicado em: 28 de janeiro de 2019


 

Sobre o ocorrido em Brumadinho/MG, faço uma análise do ponto de vista jurídico social. Houve uma tragédia, com implicações ambientais, sociais e trabalhista. Já é tido como o maior acidente trabalhista ocorrido no país, no qual foram sucumbidos pela lama mais de 200 trabalhadores. Pessoas que estavam ali exercendo a atividade profissional, lutando pelo pão de cada dia. E agora, como ficam essas famílias?

Triste realidade atual: pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) anterior, combinada com o Código Civil, as indenizações não teriam limite de valor. Após a Lei 13.467/2017, em seu artigo 223-G, foi estabelecido um limite de indenização em dano moral, teto máximo, para as indenizações levando em consideração uma série de fatores com arrimo numa escala de gravidade.

No caso de Brumadinho, temos dano em grau máximo, o dano gravissimo, pois, sobreveio o evento morte do trabalhador. Assim, após a Reforma Trabalhista, o teto máximo de indenização para dano gravíssimo é de 50 vezes o valor do último salário auferido pelo trabalhador. Como exemplo, para quem recebia um salário mínimo- R$ 998,00, a indenização máxima é de R$ 49.900,00.

Este limite é duramente criticado por advogados, juízes, procuradores do trabalho, sindicatos e já existe uma ADIN tramitando no STF sob n° 5870 questionando a constitucionalidade do dispositivo, sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes.

E então sobrevém a critica: está se “precificando” a vida? Podemos valorar a perda de uma vida com ínfimos R$ 50mil (para a hipótese de salário no importe de 1 mínimo, como exemplificado)?

Por óbvio que não! Mas, infelizmente, essa é a realidade atual e é festa forma que as famílias que perderam seus entes queridos trabalhando serão indenizadas.

Se a família comprovar que aquele trabalhador era o provedor, ou seja, o responsável pelo sustento da família, poderá pleitear uma indenização em dano material, que poderá ser estabelecida no importe do salário do trabalhador ou fixada em um mínimo e que será paga num lapso temporal levando em consideração a expectativa de vida do brasileiro, que, em 2017, pelo IBGE foi fixada em 76 anos.

Por outro lado, a família deve dar entrada no pedido administrativo de pensão junto ao órgão previdenciário – INSS. Se o trabalhador recebia um mínimo, a família receberá um mínimo. Se recebia mais, o valor será fixado após aplicação do fator previdenciário.

Bem, as indenizações acima mencionadas estão na seara trabalhista, ou seja, serão pleiteadas por aquelas famílias cujo ente que faleceu era trabalhador da empresa, da Vale ou de suas terceirizadas, entrando aí também as responsabilidades solidária e/ou subsidiária em relação as terceirizadas.

Para os demais casos, em que as pessoas não tinham vínculo empregatício direto ou terceirizado com a Vale, a indenização será pleiteada sob a égide do Código Civil, pela Justiça Comum, tendo em vista que a Vale foi privatizada há 20 anos, em 06/05/2017 no governo FHC.

Assim, para esses demais casos, não existe teto máximo de indenização. O valor será fixado pelo Juiz, recordando apenas que, após as alterações no CPC (que era de 1973), com o novo CPC/2015, as indenizações devem ser feitas em pedido definido, já quantificado em petição e não apenas requerido sob o livre arbítrio judicial. Ainda é o juiz que quantifica, mas, desde o CPC/2015 O advogado já ajuíza o pedido quantificado o valor levando em consideração os critérios punitivo (A punição do autor pelo ocorrido) bem como pedagógico (do ponto de vista de disciplinar, para que não haja reincidência). E no caso da Vale, sabemos, houve reincidência pois já assistimos a outro trágico evento ocorrido em novembro/2015, no município de Mariana/MG, de responsabilidade da Mineradora Sanmarco, controlada pela Vale.

O ocorrido possui também implicações ambientais. Seríssimas consequências ao meio ambiente, cuja mata nativa local foi literalmente engolida pelo mar de lama que escoou com o rompimento da barragem.

E então vemos que no Brasil embora exista uma consistente legislação ambiental, existe grave falha no sistema de fiscalização. A quantidade de fiscais ambientais no Ibama é insuficiente como declarado ontem em tv aberta por um de seus diretores.

O Ibama aplicou uma multa preliminar a Vale no importe de R$ 250 milhões de reais (no caso de Mariana a multa definitiva foi de R$ 345 milhões) e, a Justiça de Minas Gerais, em decisão liminar, já bloqueou o importe de R$ 1 bilhão na conta da Vale. Tal valor será transferido para uma conta judicial e ficará à disposição do Juízo para os pagamentos das indenizações as vítimas.

Triste. Muito triste. Sim, houve crime ambiental. Sim houve falha da Vale. Sim houve falha na fiscalização pelos órgãos ambientais e, infelizmente, a conta mais uma vez será paga pelo cidadão brasileiro. Uma tragédia ambiental, social e trabalhista. O que nos resta é aprimorar a nossa consciência política e cidadã para a cada dia mais lutar pelo nosso país. O que nos resta é orar pelas vítimas, pelas famílias e nos mobilizarmos nas correntes de solidariedade que já existem para envio de donativos. E que Deus abençoe o povo brasileiro e o Brasil!

Dra. FLÁVIA PACHECO S. QUEIROZ

Advogada Pós-graduada em Teoria do Estado – Direito Constitucional e Administrativo pela UFBA, Pós-graduada em Direito Tributário pela FGV/RJ e Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo JusPodium/Anhanguera. Pós-graduanda em Negócios e Direito Empresarial pelo Instituto Damásio/SP.

Coordenadora das Comissões Permanentes e Temporárias da Subseção OAB/Feira de Santana.

Telefax: (75) 3226-4849 Site: www.flaviapacheco.com