A Rádio Guaíba armou uma “arapuca” para a filósofa Márcia Tiburi e o senador Roberto Requião (PR). O radialista Juremir Machado da Silva convidou ambos para uma entrevista, mas omitiu que Kim Kataguiri do MBL também iria comparecer. A real intenção do convite era que ambos debatessem com Kim. O que se seguiu foi patético, em ambos os casos.
No dia 24, Tiburi, ao se deparar com Kim, chegou a dizer que estava com medo e se retirou. Logo depois emitiu uma carta aberta explicando seus motivos. Sua atitude é compreensível, porém, por ela ser autora dos livros “Como Conversar com um Fascista” e “Ridículo Político”, acabou virando piada entre os conservadores. O mais engraçado, no entanto, é terem usado o título do primeiro livro para apontarem uma contradição de Tiburi, mesmo que para isso precisassem admitir que sim, Kim é fascista. Até mesmo o Mamãefalei, o parceiro de MBL de Kim, cometeu esse ato falho.
No dia seguinte foi a vez de Requião, que até tentou debater, saindo-se bem no início, mas assim que Kim começou a vomitar falácias aprendidas em think tanks, Requião perdeu a pose e ficou extremamente emotivo, dizendo coisas como “você quer escravizar os brasileiros e não permitirei isso”.
Por que a esquerda possui tanta dificuldade em colocar em seu devido lugar moleques treinados em cursos de retórica sofista de instituições neoliberais como Estudantes pela Liberdade?
A resposta é simples: a esquerda desconhece ou ignora o trabalho de think tanks como Mises Institute, Cato Institute, Foundation for Economic Education (FEE), Heritage Foundation e Atlas Network. Fica claro que a ação e a influência desses centros de panfletagem do neoliberalismo e do ultraliberalismo na política brasileira são subestimados. Seu arsenal retórico sofista preparado nos EUA se mostra tão efetivo que bota medo em filósofos e tira do sério políticos experientes e com ampla formação. Pois toda, absolutamente toda a “argumentação” do Kim Kataguiri é baseada em artigos que esses think tanks e seus membros publicam, para a decepção dos trouxas que consideram Kataguri um gênio.
Enquanto não existir interesse da esquerda em conhecer todo o arsenal retórico desses think tanks, essas cenas patéticas como as que ocorreram na Rádio Guaíba continuarão a acontecer. E não adianta fugir, porque ficará ainda mais feio, para a felicidade dos editores de vídeos e criadores de memes dos canais e páginas dessa direita ultraliberal.
E será que esse arsenal retórico neoliberal/ultraliberal é tão difícil assim de ser rebatido? Não, porque não passa de um panfleto ideológico de bases bem frágeis, mas pode dar algum trabalho para ser desmistificado. Talvez esta seja a razão das pessoas de esquerda evitá-los, acham que é algo que não tem importância, então não vale o trabalho.
Por acreditar que isso é um erro, selecionei três falácias ditas por Kataguiri no seu “debate” com Requião, as quais eu já ouvi mais de uma vez ele repetindo por aí. Também irei comprovar que Kim nada mais é que um papagaio treinado em algum curso de retórica dos Estudantes pela Liberdade (ramificação do Atlas Network no Brasil). Em cada falácia mostrarei links que mostram sua origem, seguido de sua desconstrução.
Vivemos melhor do que os “reis de antigamente”?
Hoje eu, o senador, todos que estão aqui têm uma vida razoavelmente melhor do que muitos reis de antigamente que não tinham acesso à vacina, à geladeira, à televisão, à comida, simplesmente porque houve aumento de produtividade e comércio entre países.(Kim Kataguiri)
Típica falácia lógica usada à exaustão por panfleteiros de think tanks neoliberais, como Richard W. Rahn, da Cato Institute, cujo artigo você pode conferir aqui.
Dizer que hoje vivemos melhor que reis da Idade Média, além de ser um anacronismo, trata-se de uma falácia que até tem nome próprio entre os gringos, a “Not as bad as” (Não tão ruim quanto), também conhecida como Privação Relativa. De acordo com o site “Logically Falacious“, trata-se de “fazer um cenário parecer melhor ou pior, comparando-o com o melhor ou pior cenário.”
É uma falácia tão usada pelos ultraliberais nos EUA e espalhada por seus thinks tanks, principalmente na Internet, que motivou uma discussão no fórum Reddit, em que o usuário louieanderson rebate:
- A pobreza não pode ser justificada fazendo comparações com países que estão em pior situação ou tempos no passado que foram pior. Isto nada mais é que “dois erros que fazem uma falácia ou falácia da privação relativa”.
- A pobreza é relativa e não uma medida absoluta (minha observação: ou seja, devemos comparar os pobres com os ricos de hoje, essa seria uma comparação correta, não falaciosa).
- Reduzir a desigualdade geralmente é desejável / defensável, ou melhor, há um ponto em que se torna prejudicial / a desigualdade crescente é indesejável.
No entanto, mesmo que consideremos este anacronismo, ele não procede. Apesar de todo o avanço que proporcionaram à humanidade, a ciência e a tecnologia (os quais não são sinônimos de capitalismo, já que eles podem existir em qualquer outro sistema) não garantem às pessoas mais pobres uma melhor qualidade de vida do que reis do passado. O próprio capitalismo, que transforma tudo em cifras ao mesmo tempo que rejeita direitos, é o principal entrave para que os mais pobres tenham mais qualidade de vida. Basta observarmos a realidade dos trabalhadores de baixa qualificação dos grandes centros urbanos do Brasil. Vejamos:
“Reis de antigamente” não precisavam trabalhar, eles eram donos do seu tempo, o que no capitalismo é considerado luxo. Já no capitalismo, as pessoas precisam trabalhar em média de 8 a 10 horas por dia, de segunda a sexta (quando não sábado) para ter um salário mínimo ou um pouco a mais que isso. Isso considerando aqueles que estão num emprego formal, nem estou considerando os que estão em situação precarizada. A desvantagem em relação aos reis da Idade Média já começa daí.
“Reis de antigamente” não dependiam de transporte público para se locomover, enquanto o tempo de transporte do trabalhador até seu local de trabalho é em média 40 minutos (cuja jornada não será mais compensada graças à reforma trabalhista que Kim apoiou!). E bem conhecemos a situação do nosso transporte público: frotas velhas, superlotação, ônibus desconfortáveis onde até ocorrem crimes, desde assaltos até estupro. Enquanto os reis, quando precisavam se locomover, eram acompanhados de um séquito que lhes garantiam o máximo de conforto possível.
“Reis de antigamente” viviam em segurança no seu reino, enquanto um trabalhador está exposto à violência, podendo até ser atingido por bala perdida no bairro onde mora.
“Reis de antigamente” viviam em castelos e palácios, enquanto trabalhadores vivem em apartamentos ou casas minúsculos, quando não na favela.
“Reis de antigamente” tinham acesso a florestas, campos, rios e riachos limpos, respiravam ar puro, enquanto um trabalhador vive numa selva de pedra, sem contato algum com a natureza, exposto à poluição, tendo que encarar diariamente o cheiro fétido de rios que se transformaram em esgoto a céu aberto, como é na cidade de São Paulo e cidades adjacentes. Apesar de seu Estado ser governado pelo mesmo partido há mais de duas décadas, tendo tempo mais que suficiente para resolver esse problema, isso em nenhum momento indigna o MBL. E antes que alguém ache que qualidade de vida não tem nada a ver com contato direto com a natureza, saiba que essa relação é comprovada cientificamente conforme podemos conferir neste artigo da BBC e neste do The Guardian.
Até mesmo os servos desses “reis de antigamente” podem ter vivido melhor que os atuais trabalhadores do capitalismo periférico, já que estes trabalham muito mais que um servo da Idade Média (tradução aqui).
Ou seja, mesmo que consideremos a falácia anacrônica de Kim como válida, ele continua não tendo razão.
Produtividade aumenta qualidade de vida?
O aumento de produtividade é o que realmente gera o aumento da qualidade de vida e não uma legislação. (Kim Kataguiri)
Toda essa argumentação do Kim sobre a iniciativa privada ser o motor do desenvolvimento e do bem estar social (risos) está no Instituto Mises. Peguemos o artigo O mercado, e não os sindicatos, nos propiciou o lazer e o descanso e poderemos conferir que é o discurso do Kim, sem tirar nem por, até o espantalho que ele usou dos “luditas” se encontra aí. Mais uma evidência de que esses think tanks alimentam a retórica falaciosa dessa “nova direita”. O Kim não tem nada de genial, de estudioso, de original, ele apenas decora as falácias toscas desses institutos, que tanto surpreendem e dão canseira para a esquerda que subestima esse tipo de panfletagem.
Antes de iniciar a desconstrução dessa falácia, lembremos que a esquerda não é contra a produtividade, assim como não nega que ela gera riqueza no capitalismo, como a direita vive tentando espantalhar. A esquerda não é ludita. O próprio Marx deixa isso claro em seu Manifesto Comunista:
“Em seu domínio de classe que mal chega a um século, a burguesia criou forças produtivas em massa, mais colossais do que todas as gerações passadas em conjunto. Subjugação das forças da natureza, maquinaria, aplicação da química na indústria e na agricultura, navegação a vapor, estradas de ferro, telégrafos elétricos, arroteamento de continentes inteiros, canalização dos rios para a navegação, populações inteiras como que brotando do chão – que século passado poderia supor que tamanhas forças produtivas estavam adormecidas no seio do trabalho social!”
Então qual é a crítica da esquerda em relação à produtividade no capitalismo? É que, apesar das forças produtivas no capitalismo gerarem riqueza, ela fica concentrada nas mãos dos proprietários dos meios de produção, do capitalista, ou, como a direita gosta de se referir ao burguês, do empresário. O capitalismo cria riqueza, mas para poucos, apesar de se valer do trabalho social para a criação dessa riqueza ser possível. É esta contradição do capitalismo que a esquerda critica.
Pois bem, Kim diz que não, que basta ser produtivo que tudo se resolve. Basta deixar os mercados livres que a produtividade aumenta, empregos são criados, os mais pobres prosperam e o aumento da qualidade de vida será uma consequência. Desta forma os think tanks neoliberais e ultraliberias (eles, nunca o Kim, ele só repete o que lê neles) afirmam que “o capitalismo é bom para os pobres”. Nada mais falso.
Os registros históricos denunciam a condição miserável e de superexploração da classe trabalhadora no capitalismo em ascensão no século XIX. Neste período, a produtividade não encontrava nenhum entrave, logo trabalhadores não possuíam direito ou representação alguma, podendo contar apenas com a venda da sua mão de obra e com gestos de caridade, como ocorreu na Inglaterra e nos EUA.
Para comprovar isso sem deixar margem para dúvidas, usarei como exemplo os EUA, o país que é considerado, principalmente pela direita brasileira, o melhor caso de capitalismo que “deu certo”.
No gráfico que segue, podemos conferir que o aumento de produtividade nos EUA não é necessariamente acompanhado de salários mais altos para os trabalhadores, principalmente a partir dos anos 80, quando se inicia o neoliberalismo de Ronald Reagan:
Em uma entrevista para The Atlantic, o professor de Harvard Jan Rivkin – que é liberal – explica que essa enorme diferença entre produtividade e ganho real dos trabalhadores a partir dos anos 80 possui vários fatores, e reconhece entre eles o enfraquecimento dos sindicatos:
“Há uma série de causas, uma delas é a mudança implícita na tecnologia e na globalização. Outro é o baixo investimento sistemático nos recursos necessários para que qualquer empresa seja produtiva: uma população educada, grupos de mão de obra qualificada, uma rede vibrante de fornecedores, infraestrutura forte, P & D básica e assim por diante. Uma terceira é a mudança nas instituições e na política e no poder de barganha, que está incorporada no declínio da negociação coletiva e no enfraquecimento dos sindicatos. Não há dúvida de que isso seja parte da história. Quão impactante é esse fator? Acredito que ninguém tenha informações suficientes para saber.”
Desta forma fica evidente que, ao contrário do que Kim afirma, aumento de produtividade por si só não aumenta o salário da classe operária, o que impossibilita que tenha mais qualidade de vida. Pois, adivinhem só: estamos no capitalismo, a mais-valia é uma realidade. É o que inevitavelmente ocorre quando os trabalhadores perdem poder de barganha, como podemos conferir no gráfico seguinte, o qual mostra a queda contínua da taxa de sindicalização nos EUA:
Ainda é necessário lembrar que os trabalhadores também são dependentes da seguridade social, a qual serve como uma espécie de amortecedor de queda caso fiquem precarizados ou mesmo excluídos de um mercado de trabalho cada vez mais instável. A seguridade social surgiu nos EUA em 1935 e desde então cada vez mais trabalhadores estão cobertos por ela:
Como resultado, a pobreza reduziu drasticamente entre os trabalhadores estadunidenses, possibilitando-os uma terceira idade mais segura:
Kim ainda cita a vacinação e o aumento da expectativa de vida como avanços trazidos pela produtividade. Acontece que vacina é um trunfo da ciência, a qual depende de recursos públicos para pesquisa, já que a iniciativa privada apenas investe nos setores que trazem lucro a curto prazo. Desta forma, o mercado também não tem interesse de bancar campanhas de vacinação, as quais são quase sempre realizadas pelo Estado.
É necessário também lembrar que boa parte da comunidade científica é motivada pelo conhecimento e pela resolução de problemas que afligem a humanidade, e não pelo lucro. Grandes nomes da ciência se posicionavam à esquerda do espectro político, inclusive aqueles que contribuíram com o avanço das vacinas, como Jonas Salk.
Quanto ao aumento da expectativa de vida, é um trunfo da ciência e da tecnologia combinados, os quais, como já disse acima, independem do sistema econômico. Basta lembrarmos que Cuba é um dos países que apresentam uma das maiores expectativas de vida do mundo, superando o Japão em número de centenários e os EUA, a maior economia do capitalismo, na média da expectativa de vida.
Portanto, sim Kataguiri, a qualidade de vida dos trabalhadores também depende de sindicalização, de seguridade social, de saúde pública, de dispositivos que garantam uma compensação, o que você chama de “regulações”. Não, não basta produtividade. Se depender apenas dela, por vivermos num sistema que visa o lucro, os trabalhadores serão inevitavelmente superexplorados, como sempre ocorre quando ficam sem proteção alguma.
Kim citou o Paraguai das maquiladoras como exemplo de desenvolvimento. Mas será que Kim, que nunca precisou trabalhar na vida, aceitaria trabalhar numa maquiladora por 48 horas semanais, com direito a apenas 12 dias de férias por ano (direito a 30 dias só com 10 anos de trabalho!) para ganhar menos que o salário mínimo daqui? É isso que Kim diz ser aumento da qualidade de vida?
Produtividade cria emprego?
Tudo que aumentou e gerou mais produtividade posteriormente também gerou mais emprego, gerou novas profissões. (Kim Kataguiri)
Isso praticamente virou um mantra dos defensores do sistema hegemônico. Nos think tanks neoliberais podemos encontrar vários artigos repetindo o mesmo argumento, como no A automação e a robótica, ao contrário do imaginado, serão os grandes geradores dos empregos futuros, no
A evolução tecnológica criou empregos que ninguém jamais imaginou – saiba aproveitá-la, no Os robôs tomarão o seu emprego? do Instituto Mises Brasil.
Na Heritage Foundation a negação da realidade chega a distorcer dados oficiais a favor desses mantras, como aconteceu no gráfico sobre a disparidade entre produtividade e compensação do Bureau of Labor Statistics (já mostrado acima no gráfico 1) em Automation and Technology Increase Living Standards. Como desculpa, dizem que o gráfico original usou uma metodologia incorreta por não considerar o preço dos importados (???).
O argumento central de todos esses panfletos foi o mesmo usado por Kim: tecnologia traz mais produtividade, a qual aumenta o capital do patronato, que irá investir em novos negócios e criar mais empregos. Os empregados, por sua vez, como ganharão mais (risos), estimularão novos setores da economia por meio do consumo, criando novos mercados. E assim o capitalismo vai se renovando com a tecnologia, num ciclo virtuoso. Pelo menos é assim que funciona no mundo daqueles que não analisam a realidade, que fogem do empirismo como o diabo da cruz e alicerçam suas verdades em “argumentos” a priori.
Como vimos anteriormente, a parte dos empregados é falsa. Está difícil até para a classe média servir como motor de crescimento econômico por meio do consumo, dado que ela está em declínio nos EUA e na Europa. Resta desmentir que o lucro advindo da maior produtividade será reinvestido em novos negócios, criando novos empregos.
Já conferimos que o aumento de produtividade nos EUA (gráfico 1), principalmente logo após a Terceira Revolução Industrial (ou Revolução Técnico-Científica-Informacional) não foi acompanhado de um aumento de emprego (gráfico 2).
O fato é que a busca por maior produtividade no capitalismo acelera o aumento da automação, a qual mais destrói do que cria empregos. Requião está correto ao dizer que “aumento de produtividade diminui os empregos”. Aqui podemos observar que a criação de novos empregos nos EUA está em queda desde os anos 80:
Os defensores do sistema, caso admitam que a oferta de empregos nos EUA diminuiu, podem alegar que os empregos foram para a China, como costuma dizer Trump. Contudo, mesmo nas sweatshops da Ásia, a automação vem com tudo. Em 2016, a empresa taiwanesa Foxccon (sim, aquela que fabrica Iphones e coloca redes nas janelas para seus funcionários não se suicidarem) já tinha 10 de suas montadoras totalmente automatizadas. Na China a automatização da indústria é política de Estado e avança a passas largos, provocando desemprego em massa. Na província de Zhejiang, nada menos que 2 milhões de chineses perderam seus empregos para robôs…
Mas e a tal “economia compartilhada”? Seria ela uma esperança para a criação de empregos, podendo reverter esse quadro?
Kataguiri, ao tentar defender sua “tese”, cita como exemplo o Uber: “Tudo o que aumentou e gerou mais produtividade posteriormente também gerou mais empregos, gerou novas profissões. E é justamente isso que a gente tem visto hoje com o Uber, que emprega 150 mil pessoas e que há algum tempo atrás (sic) era inimaginável porque a produtividade era menor”. Ele esquece, porém, que os “empregos” criados pelo Uber são precarizados e o lucro obtido com o negócio não fica no país dos seus empregados, mas é totalmente transferido para sua matriz nos EUA.
Já sabemos que a precarização não tem importância alguma para Kataguiri, desde que não seja ele a pessoa a ter que se submeter a isso, mas sequer sua esperança no Uber como criador de empregos se sustenta. O Uber pretende adquirir 24 mil carros autônomos da Volvo, dando o sinal que num futuro próximo poderá descartar TODOS os seus motoristas.
Assim, podemos perceber que desde a Terceira Revolução Industrial a evolução tecnológica no capitalismo cada vez destrói mais empregos (evolução tecnológica não é um problema, o problema é ela estar sob a lógica desse sistema), e os que cria são precarizados e de curta existência. Com a atual tecnologia, em torno de 45% dos empregos poderiam ser totalmente automatizados. Imagine daqui a 10, 20 anos, o quanto de empregos perderão a razão de existir com o avanço da automação…
Parece que apenas os apologistas do capital estão otimistas em relação ao futuro do trabalho com o avanço da tecnologia no capitalismo. Eles acreditam que a Quarta Revolução Industrial trará mais empregos como já ocorreu nas revoluções industriais anteriores, ignorando o declínio constante do número de empregos desde os anos 60.
Ontem, os robôs ajudavam na produção, complementavam a mão de obra humana no trabalho. Hoje eles são desenvolvidos para nos substituir totalmente, inclusive no setor de serviços. De acordo com o site MIT Technology Review , 83% dos empregos que pagam menos de US $ 20 a hora podem ser automatizados nos EUA.
Então ao menos os profissionais qualificados serão poupados, certo? Errado. Pessoas como o investidor do ramo de tecnologia Fred Destin prevê que até 70% dos empregos das áreas de seguro e advocacia podem ser substituídos pela Inteligência Artificial, alertando que está por vir “um gigantesco tsunami de mudanças sociais“. No Japão, a seguradora Fukoku Mutual Life Insurance substituiu 34 de seus funcionários por um programa de IA, mostrando que a previsão de Destin não é exagero.
Não é por acaso que bilionários como Bill Gates, Ellon Musk e Mark Zuckerberg defendem a renda mínima universal. Eles sabem que a Quarta Revolução Industrial trará inevitavelmente desemprego em massa, o que será fatal para seus negócios. Sem emprego, as pessoas não poderão mais comprar os seus produtos. Nesse cenário, a instituição da Renda Mínima Universal seria uma salvação para suas empresas.
Outro que observa essa automação crescente e com pessimismo é o físico Stephen Hawking. Ele teme que o avanço tecnológico aprofunde as desigualdades sociais caso a lógica capitalista prevalecer.
Mas Fred Destin, Bill Gates, Ellon Musk, Mark Zuckerberg e Stephen Hawking devem estar enganados, não é mesmo? Quem manja mesmo de avanço tecnológico no capitalismo é Kim Kataguiri. Em seu mundo encantado do livre mercado, o aumento de produtividade há de criar uma avalanche de novos empregos porque sim.
Fora dos delírios dos panfleteiros, tudo indica que o emprego não terá mais sentido num futuro não muito distante, o qual talvez possamos presenciar. Para que isso não seja uma tragédia, será necessário superarmos a ideologia do trabalho e o próprio capitalismo. O primeiro passo é nos informamos bem para não perdermos tempo com panfletagem ideológica estúpida, que pessoas medíocres como Kataguiri repetem como papagaio, retardando a nossa capacidade de reação.
Considerações finais
A panfletagem ideológica dos think tanks neoliberais e ultraliberais deu vasta munição à “nova direita”, mas, ao mesmo tempo é a sua maior fraqueza. Bastava Requião ter perguntado ao Kataguiri quais são suas fontes e toda a credibilidade de sua retórica seria gravemente abalada. O discurso desse rapaz não tem nenhuma referência acadêmica, não é baseado em nenhum estudo sério, não possui respaldo algum, a não ser artigos de think tanks, os quais, por sua vez, usam como referência eles próprios e livros de economistas da Escola Austríaca, principalmente Ludwig von Mises.
O discurso dessa “nova direita” é pura ideologia.
Vi várias pessoas dizendo que Kataguiri merecia levar uma surra do Ciro Gomes. Eu já acho que é motivo de vergonha ter que recorrer a pessoas consideradas altamente gabaritadas para colocar Kataguiri em seu devido lugar. Como acabei de demonstrar aqui, o principal culpado por Kataguiri ainda ser considerado digno de convite por alguns setores da mídia, é a própria esquerda que não tem interesse em desconstruir a panfletagem dos think tanks que alimenta o seu discurso. Não, não precisamos de um Requião, Ciro Gomes ou Márcia Tiburi para revelar a farsa que Kataguiri representa! Um(a) jovem do ensino médio bem informado já é mais que suficiente para desmascarar gente que vive da ignorância alheia.
Por tal razão eu fiz este texto. Fica aqui minha contribuição, a qual espero esclarecer as pessoas e que seja útil para combater a desinformação que gente desonesta espalha. Pois sequer se trata de um debate, mas sim da restituição da verdade e do resgate do bom senso.
Ver também:
The New York Times – Produtividade é tudo, mas não paga bem
Economic Policy Institute – Understanding the Historic Divergence Between Productivity and a Typical Worker’s Pay
Social Security – The Evolution of Social Security’s Taxable Maximum
____________- The Development of Social Security in America
Institute for New Economic Thinking – The Outskirts of Hope: Poverty in America
Inc. – Robots Replaced 75 Percent of Jobs at This Warehouse but Not One Employee Was Cut
___- 5 White Collar Jobs That AI Will Soon Take Away
SigularityHub – How Fast Is AI Progressing? Stanford’s New Report Card for Artificial Intelligence
The Guardian – Robots threaten 15m UK jobs, says Bank of England’s chief economist
Slate – The New Wisconsin Foxconn Plant Will Probably Be Staffed By Robots—if It Ever Gets Built
Voyager – Adeus ao Trabalho: Crise do Sistema e Revolução Tecnológica